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A visita do Papa a África no ano do IIº sínodo africano 

(Reflexões do Padre José Adriano Ukwatchali, do Clero Diocesano de Benguela)
Surpreendeu-me no dia 26 de Outubro de 2008, no encerramento da XII Assembleia-geral Ordinária do Sínodo dos Bispos que versou sobre a Palavra de Deus, Bento XVI, quando na eucaristia conclusiva disse que viajaria primeiro para Camarões para entregar ao Continente o “Instrumentum laboris” (documento - base dos trabalhos do Sínodo) e depois, querendo Deus, seguiria para Angola, para celebrar os 500 anos de Evangelização.
Dupla surpresa, primeiro àquela data, a agenda pontifícia estava já quase definida e se mesmo as vozes do episcopado africano (penso naquele senegalês) se tinham pronunciado pela pertinência de uma visita do Santo Padre, já que tinha estado nas Américas, na Oceânia, em parte também na Ásia, visitando a Turquia, na Europa e faltava uma à África que pudesse antes da realização da II Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos para a África dar um alento aos cristãos deste continente, nada dizia que tal conjectura do episcopado africano encontrasse sua resposta na vontade pontifícia.
A primeira surpresa é respondida pela razão única para mim, de no fim do Sínodo sobre a Palavra de Deus convidar toda a Comunidade Internacional a ler com a Bíblia os acontecimentos que se desenrolam neste inteiro continente. A África, assim, aparece como prioritária no pensamento pontifício ao ponto de quase de modo “desprevenido” para nós, visitar as Terras de Camarões e Angola.
Nestas terras quer iniciar a sua aventura de “Peregrino do Deus-Amor” em África, para dizer que o olhar do mundo este ano se deve dirigir todo aos povos africanos que celebram o seu Sínodo, um Sínodo que vai falar sobre "A Igreja em África ao serviço da reconciliação, da justiça e da paz – "Vós sois o sal da terra... Vós sois a luz do mundo"(Mt 5, 13.14).
O Pe. Federico Lombardi S.J., diretor da Sala de Informação da Santa Sé, no dia 3 de Dezembro de 2008 exprimiu-se assim, quanto aos dois eventos: «Certamente, a África, com seus graves problemas, esteve presente em suas palavras e em seu coração, mas uma viagem sempre tem um significado fortíssimo de participação, de presença, de contacto directo. Mas 2009 será também o ano da Assembleia especial do Sínodo dos Bispos para a África, e a viagem do Papa terá um papel fundamental na sua preparação, de maneira que toda a Igreja dirigirá seu olhar à África.»
A questão sócio – antropológica está no centro das discussões do Sínodo e o Santo Padre com esta visita quer chamar a atenção ao mundo para seguir a problemática africana com os olhos de justiça, dois países abaixo do Sahara e vizinhos das regiões das nações que ainda vivem questões de reconciliação e de paz como o do Congo Democrático com o seu conflito que precisa de uma urgente solução. Temos na África Austral o caso de injustiça social caracterizado sobretudo pela situação vivida no Zimbabué.
Para Bento XVI a África é prioritária. Fê-lo sentir quando em Abril de 2008, na sua visita aos Estados Unidos de América, na sede da ONU falou da marginalização de um “autêntico desenvolvimento integral”do continente, onde a globalização até agora só trouxe os seus aspectos negativos.
Porque visita primeiro Camarões? Atrevo-me a excogitar que seja um lugar importante para o Papa, um terreno onde pode ser possível o diálogo inter – religioso, já que da agenda da viagem aí se vai encontrar com a comunidade islâmica que conta com 22% da população contra 38% de católicos e 15% de protestantes, defendi sempre que na resolução de alguns problemas, tem de se levar seriamente a temática inter – religiosa. O chamado cristianismo do sul e a famosa terceira Igreja podem ser bem consideradas com esta visita do Papa.
Nos Camarões encontramos uma presença teológica boa. Penso no padre Jean Marc ELA, hoje radicado em Canadá, depois do seu co-nacional Mveng ter sido morto. Aí também a realidade é multi – étnica e multi – linguística, assim o Santo Padre poderá falar para os anglófonos e francófonos de África num território que também viveu a colonização alemã. Eis a razão pela qual o “Instrumentum Laboris”, em minha opinião, é lançado aí e neste país se vai encontrar com o Conselho especial para a África do Sínodo dos Bispos. A exemplo de João Paulo II que visitando Camarões em 1985 já tinha considerado a ideia da realização de um sínodo e dez anos mais tarde, em 1995, ter lançado aí a Exortação Post – Sinodal “Ecclesia in Africa”, Bento XVI reconhece maturidade cristã e teológica suficientes para que a partir deste país se lance o Sínodo Africano.

Angola, opção de Bento XVI
Quanto à Angola, o Papa quer solenemente celebrar o Vº centenário da evangelização do nosso país, há 16 anos da realização do acontecimento, Bento XVI quer honrar os angolanos que desde aquele momento passaram a testemunhar com a inteira Igreja a fé em Cristo Ressuscitado. O Papa vem para dizer aos angolanos que o quinto centenário de presença de Cristo em terras angolanas significa progresso integral da pessoa angolana e esta passa pela reconstrução total, não só da terra angolana mas também do “homem angolano”.
O Sumo Pontífice, em Angola, encontra-se com os Bispos da IMBISA, pastores desta África Austral que tem problemas de boa governação, corrupção, injustiça social que serão temas candentes do sínodo de 4 a 25 de Outubro deste ano, um sínodo que todos nós africanos acreditamos ser mais uma vez todo nosso, como o primeiro.
O Vigário de Cristo confirmará os angolanos, no dia 21 de Março, as dez horas na Missa que celebrará na Igreja de São Paulo, depois de se encontrar com os políticos, o que não fará em Camarões; para dizer que o quinto centenário de fé cristã dos angolanos, deve ser assumido também pela classe política e dirigente do país e por isso,
Bem – haja a ACGD (Associação Cristã dos Gestores e Dirigentes), apenas surgida no País e empossada no passado 31 de Janeiro, no Centro convenções Talatona de Luanda.
A visita do Santo Padre não tem carácter político como pretendiam certos círculos da nossa vida nacional, Bento XVI vem abençoar Angola como bem escolheram os nossos bispos para ser lema da viagem: “BENTO XVI ABENÇOA ANGOLA”. Vem confirmar como Pedro que é, a fé dos angolanos e anima-la para que prossiga nos caminhos de uma reconstrução verdadeira da sua terra e de uma sincera reconciliação dos irmãos.
Escolheram-se assim, estes dois países, no ano de um Sínodo que considero de extrema importância para a Igreja de Africa, na continuidade daquela Iª Assembleia especial dos Bispos para Africa de 1994, esta II Assembleia que não quer anular a primeira, mas aprofundar conteúdos vitais que afligem o continente. Foi o episcopado africano que insistiu na necessidade de um outro Sínodo e o Servo de Deus, João Paulo II, no dia 13 de Novembro de 2004 decidiu celebra-lo, o que não conseguiu concretizar por ter sido chamado para o Pai em Abril de 2005, mas a ideia foi retomada pelo Sucessor, que veio no dia 25 de Junho de 2005 anunciar a intenção de convocar o segundo sínodo. A preocupação era a de penetrar com mais profundidade o tema da reconciliação que leva a justiça e a paz.
No estudo dos “lineamenta” dei-me conta, que se pretende que o sínodo seja eminentemente cristológico, pois Cristo é que nos reconcilia com o Pai e os nossos irmãos na justiça e na Paz. Toda a matéria atinente à evangelização e a pastoral quer inculcar no cristão africano que o mais importante é a difusão do “Evangelho da Justiça e da Paz” que vem do amor de Cristo. O tema escolhido pelo Papa, segundo, D. Nikola Eterovic, surgiu entre o episcopado africano nos últimos anos do pontificado de João Paulo II e que dez anos depois este aceitou a proposta, mas só Bento XVI conseguiu convocar e assim dar um tema ao sínodo.
No Sínodo vão se tratar questões ligadas aos conflitos armados, o desequilíbrio entre ricos e pobres, o tráfico de armas, a pobreza, a fome, o respeito ao direito das minorias, o papel da mulher, a exploração selvagem dos recursos e os refugiados, no dizer de D. Nikola. Nunca como hoje, os valores da reconciliação, da justiça e da paz, aparecem como de capital importância para o inteiro continente. A igreja tem o direito de propô-los em atenção de todos, tem também a autoridade moral para tal, porque dedicou energias e muitos dos seus fieis deram até a vida para defende-los e para que se construísse uma sociedade mais justa, reconciliada e pacifica.
O Sínodo deste modo, gritará ao mundo a urgência da reconciliação, da paz, da justiça e escutará mais uma vez as vozes das mulheres e homens do continente africano e sob o olhar de Pedro, daí, para mim, o valor da realização no Vaticano, escutará sem pressão, sem preferencialismos e nem comprometimentos as vozes das vítimas que no continente ainda sofrem situações de ódios, marginalizações, exploração.
Depois do “Instrumentum Laboris” restará as Conferencias Episcopais africanas nomearem os seus representantes nesta “consulta eclesial” e Angola, como no primeiro Sínodo, far-se-á representar por uma importante delegação, certamente de Bispos, porque o Sínodo é deles, mas também de uma conspícua presença de peritos em temas que interessam o Sínodo.
O Sínodo vai continuar a trabalhar sobre o badalado conceito da inculturação, tão caro aos teólogos africanos, mas nem sempre bem explorado. Creio que só um encontro pessoal do africano com Cristo e o seu Evangelho fará do africano um autêntico cristão e também um verdadeiro africano.
Para tal estudo, uma análise profunda da Religião Tradicional Africana, do fenómeno do sincretismo religioso em África, a presença de Novos Movimentos Religiosos, como a Igreja Universal do Reino de Deus, mas não numa perspectiva polémica, sim como contribuidoras para a reconciliação, a justiça e a paz.
Uma inculturação de uma fé que desperte no coração do crente africano, o anelo de se reconciliar com Deus e com os irmãos, criar estruturas de reconciliação, desmascare situações de injustiça, crie instituições protectoras da justiça e da paz.
O Sínodo evidenciará mais uma vez a formação dos leigos, são eles que vivem quotidianamente os desafios que a Igreja descreve e por isso, será uma voz a escutar.

II Congresso das Escolas Católicas 

Tema: “Situação actual das famílias em Angola”
Padre Amadeu Ngula
(amadeu.ngula@virgilio.it)

Introdução
Começo, por saudar antes de mais os organizadores deste evento por nos proporcionarem uma ocasião para juntos tentarmos reflectir sobre um tema que acho de capital importância no contexto histórico em que nos encontramos. Neste II Congresso das Escolas Católicas celebrado sob o lema: “Família e escola, juntos a educar”, julgo ser genial e urgente uma reflexão sobre a importância da família especialmente da “família como comunidade educativa”.
A nossa abordagem quer ser nesta hora, um contributo de análise, de reflexão e de compreensão das complicadas problemáticas que afectam a família hoje e da busca de soluções concretas e de caminhos de dignificação da instituição mais fundamental, fonte e santuário da vida. Para esta reflexão e acção esperamos que possa contribuir esta Conferência.
1 – Contexto global
Todos respiramos, por vezes, uma atmosfera de duvida e inquietação, ao sentirmos e vermos a situação actual da família em geral e da família angolana em particular. Também nos inquieta a correria louca para soluções fáceis e epidérmicas ou até suicidas na medida em que descansam em sonhar com o passado. Por outro lado, uma das características do nosso mundo de hoje, é a fragilidade das relações humanas. Os homens intercomunicam-se por meio de jogos de equilíbrio, minados pela mutua desconfiança e falta de sentido de responsabilidade. Se a esta fragilidade humana acrescentarmos uma desequilibrada exaltação da liberdade, a submissão aos ídolos de sempre – agora vestidos com outras cores – a busca, a todo preço, do egoísmo, individual ou comparticipado, e a procura desenfreada de prazeres mórbidos, teremos alguns traços do modo de viver de muitos jovens. Claro que tudo isto e muito mais encontra a «justificação» no facto de o homem querer ser a medida e o centro de tudo. Naturalmente que o resultado vai sendo a destruição do próprio homem. É bem certo que «o curso da história presente é um desafio ao homem que o obriga a responder»[1]. Tal desafio torna-se ainda grave com o fenómeno planetário da globalização que como sabemos aparece como um novo horizonte da vida social e é um processo que nos acompanhará por muito tempo. Não há duvidas que as formas reais com que a globalização continua a avançar no mundo, configuram-no neste momento como um processo a ética zero, uma espécie de mercado selvagem que com o pretexto da competitividade explora sem limites o homem e o ambiente. Alias, já o dizia a Gauduim et Spes, n. 47 “que a dignidade desta instituição (a família) não brilha em todas as partes com o mesmo esplendor” nem mesmo aqui na nossa terra pois já se verificam concepções contrapostas ao matrimónio[2].
Por isso, num mundo assim, em que parece cada vez mais em descrédito a função importante de muitas instituições e se deteriora, de modo impressionante, a qualidade de vida, sobretudo nas grandes aglomerações humanas, creio que a família é chamada a converter-se ainda num lugar de autêntica serenidade e de crescimento harmonioso às jovens gerações. Não é por acaso que a Igreja chame à família desde há muitos séculos de “Igreja doméstica” pois ela é o berço onde nascem e se formam todos os fiéis. Para ela, a família é como que “espelho” da Igreja e vice-versa. É o “ninho” onde se aprende a amar a Deus e as pessoas. Como primeira e insubstituível “escola”, a família tem direito a ser ajudada na sua gravíssima missão, quer por parte da Igreja, quer por parte dos poderes sócio - políticos.
O futuro do mundo e da Igreja passa através da família, pois a família é a primeira célula não apenas da comunidade eclesial viva, mas também da sociedade. Aqui em África, de modo particular a família representa a base sobre a qual está construído o edifício da sociedade. Por sua natureza, a família estende-se para alem dos limites do lar doméstico: ela está orientada para a sociedade. “A família possui vínculos vitais e orgânicos com a sociedade, porque constitui o seu fundamento e alimento contínuo, mediante o dever de serviço à vida: saem, de facto, da família os cidadãos, e é na família que eles encontram a primeira escola daquelas virtudes sociais, que são a alma da vida e do desenvolvimento da mesma sociedade. Assim, por força da sua natureza e vocação, longe de fechar-se a si mesma, a família abre-se ás outras famílias e à sociedade, assumindo a sua tarefa social.
Eis o motivo porque uma reflexão séria sobre a família hoje e no contexto em que nos encontramos, pode transformar-se em motor para a nova cultura nascente, e reconhecidos os verdadeiros valores, sejam defendidos os direitos do homem e da mulher e seja promovida a justiça a partir das próprias estruturas da sociedade. Bem o recomendou o Sínodo especial para a Africa na sua mensagem final: “Não permitais que a família africana seja ridicularizada na sua própria terra”.
2. Raízes da família em Angola
Num mundo em contínua mutação em que a instituição familiar ganha novas configurações, mesmo jurídicas, em África, no bem e no mal, é ainda cultura dominante a família alargada. A extensão do vínculo familiar em Angola é quase infinita. Todos os que se reconhecem pertencentes à mesma linhagem, refazendo-se a um antepassado comum, sentem-se membros da mesma família e, por conseguinte, unidos por laços de sangue, tradições e história. Os avós não são apenas os pais dos pais como os irmãos e primos daquele; os tios não são só os irmãos dos pais mas também os seus primos. Cria-se assim um núcleo familiar com raízes bem estendidas e um círculo amplo de relações familiares que se expande ao ritmo das novas uniões que surgem no grupo.
Não escapam a este círculo aqueles que por razões de afinidade, vizinhança ou adopção tradicional são tidos como tal pelos membros da mesma família. Neste entrelaçado quadro familiar, consoante as regiões, encontramos regimes de responsabilidade familiar nem sempre homogéneos; esta, ora recai sobre os pais, nuns casos sobre os tios ou as tias e noutros sobre os irmãos mais velhos na ausência dos primeiros, sem excluir os familiares com mais possibilidades económicas. O que é facto é que sempre alguém responde por alguém ou deveria fazê-lo. Ninguém nasce órfão, cresce órfão e morre órfão; tem-se sempre uma mãe, um tio, uma tia, uma avó a quem se reportar. Nasce-se, cresce-se e vive-se sempre no seio de uma família que se sente responsável pela vida e desenvolvimento dos seus membros.
Assim, a solidariedade familiar entre nós é uma realidade tão antiga quanto a instituição família e que perpassa todas as famílias angolanas. Este facto é evidente tanto no meio rural como no suburbano e urbano de modo particular em certos momentos da vida como: nascimento, educação, casamento, trabalho, doença, morte. São momentos de grande sociabilidade, de reforço dos laços familiares e do sentimento de pertença recíproca.
Hoje em dia, porém, este quadro apresenta-se enfraquecido, com luzes e sombras. Esta tradição perdeu força nos anos difíceis do conflito armado que provocou a desarticulação e empobrecimento das famílias, a fuga de muitas para as cidades, sem grandes condições, o aumento de famílias mono parentais e outros. Entrando assim, sorrateiramente, o que se poderia chamar um círculo fechado de relações familiares em que cada um vive mais voltado para si, olhando o problema dos outros como causas perdidas. Não favorecendo, naturalmente, o desenvolvimento de uma cultura mais activa e intrínseca de solidariedade.
É recorrente, nos dias de hoje, discutir-se nos nossos países os caminhos e vias mais eficazes e exequíveis para o desenvolvimento, por onde começar, como fazer e com quem fazer. Que sectores? Se o de serviços, do comércio, da indústria ou agricultura. Em qualquer dos casos e olhando para a experiência de outras sociedades, se pretendemos construir sociedades à medida do homem, devemos começar pela família e terminar no homem, isto é, na pessoa humana. Isto por uma razão lógica e mais que evidente: cada um de nós é membro de uma família - o político, o militar, o professor, o clérigo, o operário, o agricultor, o empresário, o jornalista, o operador social - – nasce-se e vive-se numa família.
Em Angola e em África, regra geral, a família e as famílias são ainda hoje algo mais do que um simples espaço de encontro psico-fisico natural. São o centro de decisão da vida dos indivíduos e das comunidades. Atingir a família pela positiva é envolver e promover a sociedade como um todo. A família é o primeiro espaço de sociabilização, de descoberta e de encontro com o outro, de assimilação de valores e normas.
Por isso, é urgente a promoção de políticas que protejam e apoiem o fortalecimento do núcleo familiar como primeira célula de reconstrução do tecido social e económico, como primeiro espaço de luta contra a exclusão e pelo desenvolvimento. Apresenta-se assim imperioso, para quem actua no nosso âmbito, o apoio a políticas de desenvolvimento sustentado que visem dotar a família de maior capacidade económica, de maior capacidade de intervenção social, de maior possibilidade de acesso à educação, saúde e cultura, habitação e trabalho. Políticas que provoquem a auto-estima das famílias e as transformem em sujeitos activos do próprio desenvolvimento. Fortalecê-la para o fortalecimento da sociedade, tornando-a elemento propulsor, elemento impulsionador de desenvolvimento e solidariedade nos nossos ambientes. Trabalhar pois com e para a família a vários níveis (nacional, provincial, local) e em diferentes planos (psicológico, estrutural, legal e económico).
Por outro lado, não devemos esquecer, como já aqui foi dito, que vários eixos de crescimento e desenvolvimento humano tocam vertentes da vida familiar como a educação, a saúde, a habitação, o trabalho, etc.
Nesta tarefa, um lugar particular seja reservado e ao mesmo tempo dado à mulher: este sinal de vida e de esperança contra toda esperança. Como se viu, a maioria da população em Angola é feminino, muitas famílias são geridas por mulheres, "são pai e mãe", elas são o esteio da família. São muitos os casos em que as crianças não são educadas pelos pais, mas sim pelas tias, avós e irmãs mais velhas. No meio rural, sobretudo, é com a mulher que as crianças e os jovens passam a maior parte do tempo.
3 – Luzes e sombras da família[3]
3.1- O Contexto Angolano do pós-guerra
As consequências de 27 anos de guerra sobre o consumo de recursos financeiros, a destruição de infra-estruturas básicas para o desenvolvimento, a circulação de pessoas e bens, o deslocamento de pessoas das áreas rurais – este fenômeno assume hoje proporções dramáticas pelos números envolvidos, podendo estimar-se em cerca de 4 milhões o número das famílias deslocadas das suas áreas tradicionais de residência e de exercício da actividade económica - o esgotamento dos sistemas sociais de saúde, educação, saneamento e fornecimento de água e energia, etc., foram desastrosos e contribuíram para o depauperamento de crescentes faixas da população.
Mas a guerra não aparece isolada enquanto factor de depauperamento das famílias. A instabilidade política e militar decorrente e associada introduziu elementos de perturbação na definição e condução da política económica e que foram ampliados pela circunstância de a transição para a economia de mercado não ter sido encaminhada da melhor forma. Esta convergência de factores explica que as políticas económicas globais e sectoriais tenham sido inadequadas e instáveis, tendo originado uma série de desequilíbrios económicos e sociais que estão a ser corrigidos.
As consequências da guerra sobre o sistema económico e o sub-sistema institucional do Estado foram profundas. As despesas militares limitaram as alocações financeiras para os investimentos públicos. A destruição provocada pelas acções militares, as dificuldades de se assegurarem adequados serviços de conservação e manutenção e a menor eficiência das aplicações, provocaram, em conjunto, uma extensa degradação das infra-estruturas económicas e dos equipamentos sociais. Esta foi a causa imediata da depreciação ocorrida nos sectores da saúde, educação e saneamento básico, derivando num baixo nível de desenvolvimento humano.
3.2 - Alguns indicadores do pós-guerra
De acordo com os resultados do Inquérito às Receitas e Despesas das Famílias, realizado pelo INE[4], a pobreza abrangia em 2000 cerca de 68% da população, havendo 26% em situação de pobreza extrema. Em Angola a fronteira para a pobreza extrema está situada em 22,8 USD por mês (0.76 USD por dia) e em 51,2 USD (1.70) para a pobreza. A nível internacional considera-se o limiar da pobreza em 2 USD/dia e o da pobreza extrema em 1 USD/dia.
No plano nutricional o país vive situações dramáticas no seio dos desalojados e refugiados. Estima-se que mais de metade da população angolana seja subnutrida, havendo 45 % em situação de mal nutrição crônica global.
Nos agregados extremamente pobres o consumo diário de calorias é inferior a um terço do recomendado. Cerca de 31 % dos menores de 5 anos encontra-se em desnutrição severa ou moderada. Nos centros urbanos, as famílias utilizam ¾ da despesa para fins alimentares. Mesmo assim, estima-se que apenas ¼ das famílias urbanas consuma diariamente a quantidade de calorias recomendada.
Um dos elementos com influência cada vez mais crítica no desenvolvimento humano é o acesso a água potável. Em Angola estima-se que somente 38% possa usufruir deste elemento fundamental à qualidade de vida. Apenas 13% tem ligação à rede pública de abastecimento.
Acresce que 56% da população vive sem dispor de instalações sanitárias e 50% não tem acesso à electricidade.
Estes factores reflectem-se, naturalmente, no débil estudo sanitário da população. Apenas ¼ da população angolana terá acesso a serviços de saúde, normalmente de fraca qualidade. Estima-se que as taxas de mortalidade infantil e de mortalidade abaixo dos 5 anos sejam bastante elevadas. Mais de 55% dos partos não são assistidos. A probabilidade de uma criança morrer antes de completar 5 anos é quase de 30%.
As taxas de cobertura vacinal da DPT 3 e da BCG não ultrapassam, respectivamente, 34 e 53%, reflectindo bem as dificuldades em fazer chegar cuidados primários de saúde às populações afectadas pela guerra.
A percentagem de crianças de 0-59 meses de idade que dormem com mosquiteiro tratado não ultrapassa os 23%, sendo a malária uma das principais causas de mortalidade infantil.
Não são verdadeiramente conhecidos os números reais de morte por HIV/SIDA. A taxa de 5.5% será inferior ao que se prevê ser o número efectivo dos indivíduos portadores do vírus. Sublinhe-se que apenas 23% das mulheres de 15-49 anos têm conhecimentos sobre como evitar a doença.
Uma outra dimensão do fraco nível de desenvolvimento humano e com drásticas consequências no desenvolvimento potencial é o nível educacional. Estima-se que cerca de 26% da população com mais de 15 anos seja analfabeta, havendo outras estimativas que apontam para 50%, e que a taxa de escolarização do ensino básico se situe nos 57%.
Cerca de 1/3 das crianças nunca frequentaram a escola, o que dá uma dimensão do investimento a realizar nos próximos anos.
A pressão sobre as infra-estruturas escolares é enorme, dado que uma grande proporção se encontra destruída, chegando a ultrapassar em muitos casos a mais de trinta o número médio de alunos por sala.
O nível de aproveitamento escolar é muito fraco. De 100 alunos matriculados na 1ª classe apenas 30 concluem a 4ª classe e 15 a 6ª classe. Na 1ª classe a taxa de reprovação ultrapassa os 30%.
As razões são conhecidas: deslocação forçada das famílias em consequência da guerra, deficiente grau de cobertura da rede escolar, trabalho infantil e factores de natureza cultural. A eficiência do sistema é, assim, muito fraca, havendo uma elevada taxa de desperdício de recursos. O nível de analfabetismo é maior nas mulheres. Cerca de 50% das mulheres angolanas são analfabetas. Porém, a taxa de escolarização feminina não se distância muito, na actualidade, da masculina (55%).
No meio urbano constata-se que as famílias chefiadas por mulheres estão menos marcadas pela pobreza, reflectindo a sua grande presença no mercado informal. A taxa de actividade feminina também não é distante da masculina, representando 82% desta.
Admite-se que a pobreza atinja mais as mulheres residentes nas áreas urbanas do que nos subúrbios, onde normalmente se alojam as mulheres do sector informal.
O Acordo de Paz celebrado em Abril de 2002, traz a Angola uma nova luz sobre o seu futuro. Dele decorrem igualmente objectivos estratégicos que, para além da sua justificação própria, não poderão deixar de influenciar indirectamente a redução da pobreza. Acresce que haverá igualmente que dar elevada prioridade a reinserção social de cerca de 4 milhões de Angolanos deslocados ou refugiados pela guerra incluindo 300 mil militares desmobilizados e suas famílias. Esta é uma prioridade essencial à consolidação do processo de paz e à criação da coesão nacional. É essencial assegurar a sua rápida reinserção social, de forma a evitar que se crie de forma definitiva largos pólos de marginalidade.
É neste contexto que as Famílias angolanas nascem, crescem e morrem, encontrando-se emersas dentro deste mar de limitações. Como a Família é - e será sempre enquanto houver pessoas - a célula base da mesma sociedade, urge diagnosticar as doenças da mesma, conscientes de que o seu estado é o termómetro indicador do estado de saúde da vida social.
Por isso, olhando agora para este quadro global e pelo panorama ora traçado, tentaremos apontar alguns aspectos negativos das nossas famílias, reparando, ao mesmo tempo, nos sinais da sua saúde. João Paulo II no inicio da sua exortação apostólica Familiaris Consortio (22/11/81) analisava já estes aspectos, chamando-lhes «luzes e sombras da família hoje». À luz deste documento, tentamos assinalar alguns destes factores.
3.3- Sinais negativos
- Assistimos a uma sociedade atravessada pelo hedonismo e pela massificação consumista em mudança vertiginosa e, por vezes, sem sentido;
- Meios de comunicação social a vomitarem degradação e a imporem os seus critérios mentais, muitas vezes violentos e destruidores duma sã convivência;
- Ataques, sofisticados ou abertos, por parte de legislações civis, dirigidos à medula familiar (leis do aborto e dum irracional planeamento familiar, informação sexual nas escolas ou defesa de laços familiares que sejam libertadores da escravidão imposta pela moral burguesa e capitalista);
- Dificuldades económicas com os consequentes males, tais como a falta de habitação condigna, o desemprego, a migração incontrolada, famílias divididas e, às vezes destroçadas;
- Falta duma politica familiar que procure ajudar e apoiar a paz e unidade familiares;
- Ambiente de degradação familiar como se fosse uma situação normal, porque «moderna»;
- A carência duma correcta educação, tendo em mira um crescimento harmonioso das várias faculdades humanas e sobrenaturais;
- Vidas de pais e filhos a correr à procura do “material” sem portas de saída;
- A casa ser mais hotel do que lar;
- Abandono dos idosos e doentes porque “incómodos e improdutivos;
- Falta de preparação para o casamento, ora porque o ambiente familiar e social lhe é adverso, ora porque o empenho da comunidade humana nem sempre terá sido o mais correcto.
Nestes choques brutais, devidos a rápidas mudanças, a família perdeu a sua coesão e, consequentemente, a juventude bebe já a partir do focolar familiar todos os vícios que hoje estamos assistindo.
3.4 – Sinais positivos:
a) Crescente apreço pelos valores como a liberdade e sentido de responsabilidade por parte dos pais a propósito da educação dos filhos;
b) Noivos que procuram preparar o seu casamento, colocando a sua principal preocupação no pacto conjugal, mais do que nas “cerimónias” do casamento;
c) Muitos pais já conversam muito com os filhos;
d) Sentido de igualdade da mulher em relação ao homem;
e)Casais que se ajudam de diversas maneiras: ora conversando entre si sobre o modo de educar os filhos, ora sobre a necessidade de os acompanharem pelo seu exemplo;
f) Uma crescente tomada de consciência da urgência em se realizar uma correcta e constante pastoral familiar.
4) A Família e a vida[5]
O momento histórico em que vivemos, julgo que torna necessário apelar para a consideração, a estima, o amor e até a defesa da vida humana. Em tempos passados, a vida era geralmente respeitada por todos; funcionava e era ouvido o instinto de sobrevivência. Hoje, num ambiente social em que são cada vez mais patentes os elementos da «cultura da morte», a vida está ameaçada na sua identidade, na sua qualidade e até na sua existência. Pareceu-me, pois que é urgente recorrer ao mais profundo da consciência humana para inverter esta tendência, motivando e promovendo opções em favor da vida no universo, pois, pode estar em causa o futuro da humanidade. A escola Católica, colocando-se ao lado do que há de mais sagrado no homem, situa-se ao lado da vida. Tornando-se sua defensora, assume, uma vez mais a missão de anunciar a boa nova da vida, defendendo e promovendo a dignidade do universo criado e do homem que nele habita. E é à luz desta orientação que se deve entender a própria doutrina da Igreja sobre a sexualidade humana, vocacionada para a comunhão fecunda no matrimónio; sobre a inviolabilidade da vida humana, nascente ou terminal; sobre as questões pertencentes aos domínios da ecologia e da bioética; sobre a família, clima natural para o nascimento, desenvolvimento, educação e amadurecimento do homem. Daqui também a posição da Igreja acerca dos deveres da sociedade e do Estado, das suas instituições, organização e poder, relativamente à família e às condições necessárias para uma vida digna.
Vinda de Deus e sendo sinal do seu olhar amigo sobre o mundo e a história, a vida humana – como qualquer outro género de vida – é fonte de valores morais para quantos dela participam e para quem tem a missão de promover a vida de qualidade: a sociedade, e concretamente a Escola e o Estado. A vida é um dom; é também uma tarefa e uma responsabilidade. Os deveres em que estas se traduzem bem podem ser a base do programa de reflexão e de acção para este nosso Congresso dedicado à Família. De modo muito resumido tentaremos fazer aqui a súmula dos deveres mais significativos:
a) Amar a vida. Amar a vida significa gostar de viver, criar condições para que todos sintam a vida como um bem altíssimo, levar a vida com alegria como uma vocação e uma missão. Amar a vida é uma forma de amar a Deus e de agradecer-lhe porque nos criou, porque criou todas as coisas para o serviço, o bem-estar e o contentamento dos homens. O suicido, infelizmente, ainda frequente, é um atentado inaceitável contra o amor se si próprio, tal como o é o homicídio em relação ao amor ao próximo. Pensamos que a Família deve ser o lugar de crescimento do homem em todas as dimensões, a grande escola da alegria de viver, e a revelação do rosto paterno e materno de Deus. A família deverá ser também o lugar do louvor e da gratidão pelo dom da vida.
b) Promover e defender a vida. Promove-se e defende-se a vida tomando sempre partido por ela, desenvolvendo e difundindo a «cultura da vida» e eliminando todos os obstáculos que se lhe opõem. Defender a vida significa, por isso, ser intransigente no que diz respeito ao aborto e ao infanticídio, crimes abomináveis (cf. GS 51). Abomináveis e infamantes são também a eutanásia, a guerra, as mutilações e esterilizações (cf. GS 27). São igualmente reprováveis as atitudes de passividade e inconsciência que estão, muitas vezes, por detrás dos votos dados pelos parlamentos na aprovação ou legalização destas e doutras aberrações indignas da civilização. A promoção e a defesa da vida, própria e dos outros, nascem e crescem sempre nas famílias que superam o egoísmo e o consumismo, acolhem com gratidão as crianças, com generosidade os deficientes, com carinho aos velhos, sabem dar a cada um o seu valor e lugar e olham com sinceridade e esperança o futuro.
c) Humanizar e personalizar a vida. A humanização da vida supõe a existência e a intensificação de condições como o sustento suficiente, o vestuário, a habitação condigna, o trabalho seguro e não precário, a instrução, os meios de saúde necessários (GS 27). Do mesmo modo, precisa de um clima de paz, dum ambiente limpo, de uma escola dignificada, de relações sociais construtivas, duma organização social e politica ao serviço de todos e não dos interesses de alguns. A qualidade de vida verdadeiramente humana significa também “o direito de escolher livremente o estado de vida e construir família, o direito à educação, à boa fama, ao respeito dos outros, à conveniente informação, o direito de agir segundo as normas da própria consciência, o direito à protecção da sua vida (segurança) e a justa liberdade, mesmo em matéria religiosa (GS 26). Qualidade de vida é ainda o equilíbrio afectivo e psicológico que permite à pessoa uma realização feliz num relacionamento normal e construtivo com os outros; é também o equilíbrio na vida social, na busca do bem comum, no desenvolvimento das relações de solidariedade, de responsabilidade e de participação. A família é o primeiro lugar da experiência de comunhão entre pessoas e a primeira escola de humanização, personalização e sociabilidade.
d) Não desprezar a vida. Há variadas formas de desprezo e de degradação da vida. Algumas «corrompem a civilização humana e desonram mais aqueles que as cometem do que aqueles que as padecem; são as que mais gravemente ofendem a honra do Criador». (GS 27). Devem denunciar-se sem equívoco nomeadamente as seguintes: a tortura, violação, prisão arbitrária, escravidão, prostituição, comércio de mulheres e crianças, condições degradantes de vida e de trabalho, tráfico e consumo de drogas, alcoolismo, corrupção, manipulação e chantagem (cf. GS 27). Além disso, não é lícito pôr em risco grave a vida própria ou alheia. São igualmente de condenar a pouca atenção que continua a prestar-se «às normas sociais estabelecidas para defender a saúde ou para regular o trânsito» (GS 30), a manipulação sem cuidado de materiais perigosos, o tratamento, guarda e exportação de produtos ou resíduos tóxicos, a poluição do ar e a sonora, a degradação do meio ambiente físico, moral e social.
Neste sentido, este Congresso nutre fundadas esperanças de que a reflexão ora em curso sirva para despertar as consciências e alertar todos os congressistas e responsáveis dos destinos do pais para a necessidade urgente de proteger, promover e defender a vida através da educação. A todos fazemos um apelo a que contribuam para a vida e sua qualidade em todos os aspectos, de tal maneira que cada um sinta que vale a pena viver e fazer viver!
Estamos convencidos de que sem educação não há desenvolvimento da vida humana; pois a educação é consequência obrigatória da procriação e, portanto, a educação dos filhos é tarefa prioritária e insubstituível dos pais; por isso, os responsáveis institucionais da sociedade e do Estado têm o dever de proporcionar às famílias as condições materiais, morais e espirituais de educação e todos os apoios para que a educação familiar prossiga na escola, de acordo com a escolha livre dos pais. A escola Católica não pode deixar de ensinar o Evangelho do matrimónio, da família e da vida e de se comprometer com todas as soluções que sejam resposta aos problemas e propostas de sentido mobilizador.
Nas mais variadas parcelas da pessoa humana e nas mais diversas atitudes do casal surgem consequências de todo o tipo que não são mais do que reflexos da radical desorientação sobre o mesmo ser da pessoa. Por isso, neste II Congresso, queremos defender a tese segundo a qual “a interacção pessoa-familia-sociedade é tão profunda que a claudicação da dignidade pessoal do homem conduz a uma sociedade não só desumanizada, mas também desumanizante. Do mesmo modo, o re-encontro do homem com as naturais exigências da sua dignidade de pessoa é o caminho acertado para uma sociedade personalizada e personalizante. Portanto, no matrimónio e na família joga-se, hoje a demissão ou o resgate dos valores e a partir daí, a humanização ou a despersonalização de toda a sociedade[6].
Conclusão
A afirmação de que a família hoje vive uma crise profunda começa já a ser um lugar comum[7]. É bem verdade que há uma crise, mas crise significa ruptura, significa mudança, significa, corte com um passado para uma re-estruturação do presente. A crise não implica necessariamente uma situação de pura negatividade. Se é verdade que há, por um lado, desequilíbrios e aspectos verdadeiramente negativos que ameaçam e fazem perigar a estabilidade e a felicidade da família, por outro, há também aspectos positivos que importa desenvolver e incrementar e que se deixam entrever como vectores dessa família do futuro que, na crise vai tomando corpo.
É evidente que se deve rejeitar uma atitude de falso optimismo, mas é preciso reagir também contra um pessimismo paralisante que não nos conduz a lado nenhum. Devemos antes olhar a realidade com olhos da esperança e discernir nela aquilo que permite que a família continue a cumprir a sua missão, aceitando, integrando e mesmo transfigurando as novas condições de vida. Há de facto alguns tesouros na família actual que devemos cuidar, proteger e desenvolver. Pensemos, por exemplo, na promoção notória da dignidade da mulher. A sua esfera de acção é cada vez mais larga e o seu papel interventivo na sociedade é insubstituível. Muito há ainda a fazer na legislação social para que este passo em frente e a dignidade da pessoa humana não seja pervertida, ao ter como resultado a desvalorização e ate o desaparecimento do papel da mulher como dona de casa, esposa e mãe. Alguns problemas da família hoje, resolver-se-iam se a mulher tivesse a possibilidade de suspender a sua prestação de trabalho durante algum tempo para dar assistência aos filhos, sobretudo durante a primeira infância, sem prejuízo da sua reintegração no trabalho e da sua carreira profissional. No que respeita à educação, que é o primeiro e fundamental dever da família, se é verdade que há atitudes de demissão por parte de alguns pais, encontramos também muitos outros verdadeiramente preocupados e empenhados em construir personalidades equilibradas, maduras e responsáveis. E, embora alguns caiam numa excessiva permissividade em relação aos filhos, também é verdade que a autoridade do passado, assente numa mera relação de poder que resvala muito facilmente para o autoritarismo, vai dando lugar muitas vezes à valorização da autoridade fundada no exemplo, no dialogo e também na coação e no castigo movidos no amor. E, se bem que na agitação e na correria dos nossos dias haja cada vez menos tempo para a família se encontrar a apostar na qualidade desse pouco tempo têm para partilhar a vida – um passeio numa tarde de domingo, umas ferias em conjunto, para quem as tem, - embora não compensem totalmente, pelo menos mitigam essa falta de tempo para o encontro no quotidiano que caracteriza as famílias modernas.
Apesar do número crescente e preocupante de divórcios e separações, há efectivamente uma maior atenção à qualidade das relações interpessoais. Pensemos por exemplo, no espírito de entre-ajuda que surge em casais que partilham espontaneamente as tarefas domésticas: pensemos também na valorização do papel do pai como educador, chamado a uma corresponsabilidade efectiva na educação e não, como acontecia no passado, a intervir apenas esporadicamente para exercer a sua autoridade. Em vez de nos assustarmos com o número de casamentos que fracassam, podemos antes olhar para aqueles que, em muito maior número, resistem e têm sucesso num mundo cuja mentalidade corrente aceita facilmente o divórcio …, o que prova que o homem e a mulher são feitos para a entrega total e indissolúvel e que a realização das pessoas em concreto, e da família no seu todo, passa por essa entrega no amor. É que, neste tempo de profunda aceleração histórica, assistimos por vezes a transformações alarmantes que chegam a pôr em causa a família na sua própria natureza; ora, é contra estas que temos de reagir com firmeza fazendo render aquilo que na mudança vai sendo gérmen de uma família renovada e fiel a si mesma e à humanidade. Termino, acrescentando Camões, quando dizia: «mudam-se os tempos, mudam-se as vontades» … mas não se mudam as verdades.
“Família e escola, juntos a educar”.

Obrigado, tenho dito!


[1] Gaudium et Spes, n. 4.
[2] Com efeito, há quem considere o matrimónio como situação de facto, sendo o acto de contrair (pacto conjugal) como que uma vontade actual e superficial, numas circunstâncias concretas, num viverem duas pessoas unidas mas sem compromisso nem de vida futura nem de todos os aspectos conjugáveis da pessoa humana. O cúmulo de tudo: tende-se a olhar para o matrimónio canónico ou como um costume a seguir ou até como um vestígio duma sociedade burguesa e capitalista. Seria portanto algo a superar porque estaria em desarmonia com o homem moderno, livre, desinibido e a –religioso. Nesta perspectiva, casar-se é manifestar que essa vontade já terminou. E tudo isso se diz e se faz com fundamento numa noção de concepção personalista do Matrimónio.
[3] Cfr. João Paulo II, Familiaris Consortio (22/11/81)
[4] Cfr. Relatório das Nações Unidas sobre o desenvolvimento em Angola à luz dos objectivos do milénio,
[5] Cfr. Nota da Comissão Episcopal Portuguesa sobre a Família (1994).
[6] Cfr. VILADRICH Pedro-Juan, Agonia do casamento legal (1978).
[7] Cfr. DE MIRANDA, Manuela E. Tiago, Família: a critica da crise, in «Revista de liturgia e pastoral», 5 (1994), p. 1285.

O Papel do Professor 

From: Catarina Samba
O professor é o grande agente do processo educacional, diz o Dr. Gabriel Chalita, autor do livro "Educação - a solução está no afeto". E ele prossegue: "A alma de qualquer instituição de ensino é o professor. Por mais que se invista na equipagem das escolas, em laboratórios, bibliotecas, anfiteatros, quadras esportivas, piscinas, campos de futebol - sem negar a importância de todo esse instrumental -, tudo isso não se configura mais do que aspectos materiais se comparados ao papel e à importância do professor." Mas, professor Gabriel, perguntamos, há quem afirme que o computador irá substituir o professor, e que nesta era em que a informação chega de muitas maneiras, o professor perdeu sua importância. Ele responde, com serenidade: "O computador nunca substituirá o professor. Por mais evoluída que seja a máquina, por mais que a robótica profetize evoluções fantásticas, há um dado que não pode ser desconsiderado: a máquina reflete e não é capaz de dar afeto, de passar emoção, de vibrar com a conquista de cada aluno. Isso é um privilégio humano." Deste ponto em diante, deixaremos que a entrevista siga como monólogo, porque quem tem ouvidos de ouvir, que ouça. "Pode-se ter todos os poemas, romances ou dados no computador, como há nos livros, nas bibliotecas; pode até haver a possibilidade de buscar informações pela Internet, cruzar dados num toque de teclas, mas falta a emoção humana, o olhar atento do professor, sua gesticulação, a fala, a interrupção do aluno, a construção coletiva do conhecimento, a interação com a dificuldade ou facilidade da aprendizagem. Os temores de que a máquina possa vir a substituir o professor só atingem aqueles que não têm verdadeiramente a vocação do magistério, os que são meros informadores desprovidos de emoção. Professor é muito mais do que isso. Professor tem luz própria e caminha com pés próprios. Não é possível que ele pregue a autonomia sem ser autônomo; que fale de liberdade sem experimentar a conquista da independência que é o saber; que ele queira que seu aluno seja feliz sem demonstrar afeto. E para que possa transmitir afeto é preciso que sinta afeto, que viva o afeto. Ninguém dá o que não tem. O copo transborda quando está cheio; o mestre tem de transbordar afeto, cumplicidade, participação no sucesso, na conquista de seu educando; o mestre tem de ser o referencial, o líder, o interventor seguro, capaz de auxiliar o aluno em seus sonhos, seus projetos. A formação é um fator fundamental para o professor. Não apenas a graduação universitária ou a pós-graduação, mas a formação continuada, ampla, as atualizações e os aperfeiçoamentos. Não basta que um professor de matemática conheça profundamente a matéria, ele precisa entender de psicologia, pedagogia, linguagem, sexualidade, infância, adolescência, sonho, afeto, vida. Não basta que o professor de geografia conheça bem sua área e consiga dialogar com áreas afins como história; ele precisa entender de ética, política, amor, projetos, família. Não se pode compartimentar o conhecimento e contentar-se com bons especialistas em cada uma das áreas. Para que um professor desempenhe com maestria a aula na matéria de sua especialidade, ele precisa conhecer as demais matérias, os temas transversais que devem perpassar todas elas e, acima de tudo, conhecer o aluno. Tudo o que diz respeito ao aluno deve ser de interesse do professor. Ninguém ama o que não conhece, e o aluno precisa ser amado! E o professor é capaz de fazer isso. Para quem teve uma formação rígida, é difícil expressar os sentimentos; há pessoas que não conseguem elogiar, que não conseguem abraçar, que não conseguem sorrir. O professor tem de quebrar essas barreiras e trabalhar suas limitações e as dos alunos. Não há como separar o ser humano profissional do ser humano pessoal. Certamente o professor, como qualquer pessoa, terá seus problemas pessoais, chegará à escola mais sisudo que o habitual e terá mais dificuldade em desempenhar seu trabalho em sala de aula. Os alunos notarão a diferença e a eventual impaciência do professor nesse dia, mas eles não sabem os motivos da sisudez do mestre e podem interpretar erroneamente. Exatamente por isso é preciso cuidar para que contrariedades pessoais não venham à tona, causando mágoas e ressentimentos. Ao enfrentar problemas de ordem pessoal o professor deve procurar o melhor meio para sair do estado de espírito sombrio e poder desempenhar seu trabalho com serenidade. A leitura dos clássicos, o contato com a arte, com a natureza, uma boa terapia, uma reflexão mais profunda sobre a contrariedade por que se está passando pode ajudar muito. Ninguém é mau em essência, como já dissemos, mas um professor descontrolado deve rever seu comportamento sob pena de ser mal interpretado por seus alunos. Sabe-se que a dificuldade financeira é um obstáculo para a maior parte dos professores deste país, mas não pode servir de desculpa: há numerosos programas culturais gratuitos, há bibliotecas públicas, a natureza está aí e não cobra nada para ser contemplada. Não se trata de ignorar a lamentável situação em que se encontram os professores no que diz respeito aos patamares salariais. Essa classe vem sendo tratada com desrespeito pela grande maioria dos administradores públicos do país. Para obras de cimento e cal sempre há dinheiro, para um salário digno de quem forma o cidadão brasileiro não há verbas. Entretanto, isso não pode ser desculpa para a acomodação, para a negligência ou para a impaciência. O professor tem o direito constitucional de fazer greve e ninguém pode deixar de respeitá-lo por isso, mas não tem o direito de ser negligente, incompetente, displicente, porque o aluno não tem culpa. Se o problema é com os administradores, eles é que devem ser enfrentados. É melhor entrar em greve, com todos os problemas decorrentes disso, do que dar uma aula sem alma apenas porque não se ganha o suficiente. Desde os primórdios da cultura grega, o professor se encontrar em uma posição de importância vital para o amadurecimento da sociedade e a difusão da cultura. As escolas de Sócrates, Platão e Aristóteles demonstram a habilidade que tinham os pensadores para discutir os elementos mais fundamentais da natureza humana. Não perdiam tempo com conteúdos engessados. Discutiam o que era essencial. Sabiam o que era essencial porque viviam da reflexão, e a aula era o resultado de um profundo processo de preparação. Assim foi a escola de Abelardo, com os alunos quase extasiados pelo carisma do professor e pela forma envolvente e sedutora como eram tratados os temas. Sócrates andava com seus alunos e ironizava a sociedade da época com o objetivo de fazê-los pensar, de provocar-lhes a reflexão, o senso crítico. Não se conformava com a passividade de quem acha que nada sabe e nunca conseguirá sabem nem com a arrogância de quem acredita que tudo sabe e, portanto, nada mais há que mereça ser estudado ou refletido. Jesus Cristo, o maior de todos os mestres da humanidade, contava histórias, parábolas e reunia multidões ao seu redor, fazendo uso da pedagogia do amor. Quem era esse pregador que falava de forma tão convincente, ensinava sobre um novo reino e olhava nos olhos com a doçura e a autoridade de um verdadeiro mestre? A multidão vinha de longe para ouvi-lo falar, para aprender sobre esse novo reino e sobre o que seria preciso fazer para alcançar a felicidade. O grande mestre não precisava registrar as matérias, não se desesperava com o conteúdo a ser ministrado nem com a forma de avaliação, se havia muitos discípulos ou não. Jesus sabia o que queria: construir a civilização do amor. E assim navegava em águas tranqüilas, na maré correta, com a autoridade de quem tem conhecimento, de quem tem amor e de quem acredita na própria missão.
Sócrates e Cristo foram educadores, formaram pessoas melhores. Não há como negar que os numerosos profetas ou os simples contadores de história conseguiram tocar e educar muito mais do que qualquer professor que saiba de cor todo o plano curricular e tudo o que o aluno deve decorar para ser promovido. Ninguém foi obrigado a seguir a Cristo, não havia lista de presença nem chamada, e mesmo assim a multidão se encantava com seus ensinamentos - ele tinha o que dizer e acreditava no que dizia, por isso foi tão marcante. O professor precisa acreditar no que diz, ter convicção em seus ensinamentos para que os alunos também acreditem e se sintam envolvidos. Precisa de preparo para ir no rumo certo e alcançar os objetivos que almeja. O professor que não prepara as aulas desrespeita os alunos e o próprio ofício. É como um médico que entra no centro cirúrgico sem saber o que vai fazer e sem instrumentação adequada. Tudo na vida exige uma preparação. Uma aula preparada, organizada, com o conteúdo refletido muito provavelmente será bem sucedida. Aula previamente preparada não significa aula engessada: não lhe dará o direito de falar compulsivamente, sem permitir intervenção do aluno, não dialogar com a vida, não dar ensejo a dúvidas; o professor não deixará de discutir outros temas que surgirem apenas porque tem que cumprir o roteiro de aula que preparou. Pode até ocorrer que ele dê uma aula diferente daquela que planejou, mas isso é enriquecedor. Preparação é planejamento. Muitos professores fazem o planejamento do início do ano de qualquer maneira, apenas para cumprir exigências formais. É lamentável. Se o professor investir tempo refletindo cada item de seu planejamento, sem dúvida terá muito menos trabalho durante o ano para o cumprimento de seus objetivos porque planejou, sabe onde quer chegar, sabe o tipo de habilidade que precisa ser trabalhada e como avaliar o processo do aluno. A partir da minha experiência por meio de contatos no Brasil e fora daqui, passo agora a compor um quadro com os tipos mais comuns de professor que se pode encontrar. Como todo o respeito que merece a categoria como um todo, nota-se freqüentemente a recorrência dos mesmos gêneros de atuação em sala.
PROFESSOR ARROGANTE
Ele se acha o detentor do conhecimento. Fala de si o tempo todo e coloca os alunos em um patamar de inferioridade. Ao menor questionamento, pergunta quantas faculdades já fez o aluno, se já escreveu algum livro, se já defendeu teses, para se mostrar superior. Gosta de parecer um mito; teima em propalar, às vezes inventando, os elogios que recebe em todos os congressos dos quais participa; conta histórias a respeito de si mesmo para mostrar quanto é competente e querido. Não gosta de ser interrompido, não presta atenção quando algum aluno quer lhe contar um feito seu. Só ele interessa; só ele se basta.
O que se pode dizer é que o professor arrogante tem uma rejeição a si mesmo e não acredita em quase nada do que diz. Como sofre, possivelmente, de complexo de inferioridade, precisa de auto-afirmar usando a platéia cativa de que dispõe: os alunos.
PROFESSOR INSEGURO
Tem medo dos alunos; teme ser rejeitado, não conseguir dar aula, não ser ouvido porque acha que sua voz não é tão boa. Não sabe como passar a matéria apesar de ter preparado tudo; acha que talvez fosse melhor usar outro método; teme que os alunos não gostem de sua forma de avaliação. Começa a aula várias vezes e se desculpa, e pede ainda que esqueçam tudo, e recomeça. Tem receio de que os pais dos alunos não gostem de sua forma de relacionamento com eles, receia também a direção da escola, os outros professores e se vê paralisado, com seu potencial de educador inutilizado. O medo de fato paralisa e dificulta o crescimento profissional. Apesar de ser um sentimento normal e freqüente, é preciso que seja trabalhado. Um ator quando entra em cena geralmente está tenso, nervoso, mas seu talento consiste em não transmitir essa sensação para a platéia. Ele precisa confiar no que está fazendo e superar a insegurança. Se o professor não acreditar no que diz, será ainda mais difícil ao aluno fazê-lo.
PROFESSOR LAMURIANTE
O professor lamuriante reclama de tudo o tempo todo. Reclama da situação atual do país, da escola, da falta de participação dos alunos, da falta de material para dar um bom curso, do currículo, das poucas aulas que tem para ministrar sua matéria. Passa sempre a impressão de que está arrasado e não encontrar prazer no que faz. Às vezes se aproveita da condição de professor e usa a turma para fazer terapia. Fala do filho, da filha, da empregada, da cozinheira, da ingratidão de amigos etc. Mais uma vez, se trata do abuso da platéia cativa.
A dignidade de um profissional é requisito básico para uma relação de trabalho. No magistério, essa norma é um mandamento, na medida em que o professor trata com pessoas em formação, que não são seus iguais em nenhuma hipótese.
PROFESSOR DITADOR
É aquele que não respeita a autonomia do aluno. Trabalha como se fosse um comandante em batalha; exige disciplina a todo o custo. Grita e ameaça. Não quer um pio, zela pela sala como se fosse um presídio; ninguém pode entrar atrasado nem sair mais cedo; ninguém pode ir ao banheiro, é preciso disciplinar também as necessidades fisiológicas. Dia de prova parece também dia de glória: investiga aluno por aluno, proíbe empréstimo de material, ameaça quem olhar para o lado. Tem acessos de inspetoria higiênica, investiga as unhas das mãos e os cabelos. Grita exigindo silêncio quando o silêncio já reinava desolado na sala. O professor ditador está perdido na necessidade de poder. Poder e respeito não se impõem, se conquistam. Há determinadas práticas que se perpetuam sem razão; são contraproducentes e muito danosas para o aluno mas, principalmente, fazem muito mal ao professor que as revive.
PROFESSOR BONZINHO
Diferentemente do ditador, o bonzinho tenta forçar amizade com o aluno. Gosta de dizer quanto gosta dos alunos. Traz presentes, dá notas altas indiscriminadamente. Seus alunos decidem se querem a prova com ou sem consulta, em grupo ou individualmente, depois propala sua generosidade. Às vezes ainda tem a audácia de se comparar aos colegas, afirmando que os outros professores não fariam isso. Durante a prova responde as questões para os alunos, para que não fiquem tristes, para que não tirem nota baixa. Concede outra chance e dá outra prova para quem foi mal, idêntica à anterior só para tirar uma nota bem boa. Pede desculpa quando a matéria é muito difícil e só falta pedir desculpa por ter nascido.
A amizade também é um processo de conquista e esse professor acaba sendo motivo de chacota entre os alunos. Tudo o que vem dele parece forçado porque procede de uma carência de atenção e de uma necessidade infantil de aceitação.
PROFESSOR DESORGANIZADO
Esse aparece em aula sem a menor idéia do que vai tratar. Não lê, não prepara as aulas, não sabe a matéria e se transforma em um tremendo enrolador. Sua desorganização é aparente: como não faz planejamento, não sabe o tipo de tarefa que vai propor, então inventa na hora e na aula seguinte não se lembra de cobrar os alunos nem comenta sobre o que havia pedido. Como não sabe o que vai ministrar, põe-se a conversar com os alunos e a discutir banalidades. De repente, para dinamizar a aula, resolve promover um debate: o grupo A defende a pena de morte, o grupo B será contrário à pena de morte, sem nenhum preparo anterior, nenhum subsídio contra ou a favor. O profissional precisa ter método. A organização é prova do compromisso que ele tem para com os alunos. A improvisação, muitas vezes necessária e enriquecedora, não prescinde do planejamento, como já dissemos.
PROFESSOR OBA-OBA
Tudo é festa! Esse tipo adora as dinâmicas em sala. Projeta muitos filmes, leva algumas reportagens; faz com que os alunos saiam da sala para observar algum fenômeno na rua ou no céu, fala em quebra de paradigmas, tudo conforme pregam os chamados consultores de empresas, mas sem amarração, sem objetividade. A dinâmica pode ser ótima, mas é preciso que o aluno entenda por que ele está fazendo parte daquela atividade. O filme pode ser fantástico, mas se cada dia vier um filme diferente e não houver discussão, aprofundamento, perde-se o sentido. Há aquele professor que gosta de levar música para a sala de aula, comentar uma letra da MPB ou explicar As quatro estações, de Vivaldi. É interessante, desde que não se faça isso sempre, porque os alunos sentem falta do nexo com a matéria que devem aprender. E o que deveria ser um elemento agradavelmente surpreendente se transforma em motivo de chacota.
Esse professor é bem intencionado, não há dúvida. Mas falta-lhe estabelecer com os alunos a relação desses jogos de sensibilização com o conteúdo da matéria que cabe a ele ministrar.
PROFESSOR LIVRESCO
Ao contrário do oba-oba, o professor livresco tem uma vasta cultura. Possui um profundo conhecimento da matéria, mas não consegue relacioná-la com a vida. Ele entende de livros, não do cotidiano. Além disso, não utiliza dinâmica alguma, não muda a tonalidade da voz, permanece o tempo todo em apenas um dos cantos da sala e suas ações são absolutamente previsíveis. Todos sabem de antemão como vai começar e como vai terminar a aula; quanto tempo será dedicado para a exposição da matéria, quanto tempo para eventuais questionamentos. Não importa se o aluno está acompanhando ou não seu raciocínio, ele quer dizer tudo o que preparou para ser dito. Apesar de ter embasamento, dominar o conteúdo, é necessário aprimorar a forma, trabalhar com a habilidade da didática. Ensaiar mudança na metodologia. Às vezes, o professor livresco piora quando resolve inovar: leva um retroprojetor para a sala, e as lâminas contêm, transcrito, tudo o que vai ler em voz alta. E aquela aula se torna interminável e cansativa.
PROFESSOR "TÔ FORA"
Ele não se compromete com a comunidade acadêmica. Não quer saber de reunião, de preparação de projetos comuns, de vida comunitária. Nem festa junina, nem gincana cultural ou esportiva, nem festa de final de ano. Ele dá sua aula e vai embora. Muitas vezes é até bom professor, mas não evolui sua relação social nem o conteúdo interdisciplinar porque não está presente. Alguns são arrogantes a ponto de achar que não têm o que aprender, que estão acima dos outros professores e portanto não vão ficar discutindo bobagens. Outros estão preocupados com as lutas do dia-a-dia pela sobrevivência e como não estão ganhando para trabalhar em festas juninas, por exemplo, se negam a participar. O processo educativo é comunitário. O bom ambiente escolar depende da participação de todos. A mudança dos paradigmas ocorre quando cada um dá sua parcela de contribuição e é capaz de permitir que o outro também opine, também participe. Ninguém é uma ilha de excelência que prescinda de troca de experiências.
PROFESSOR DEZ QUESTÕES
Para sua própria segurança, o professor "dez questões" reduz tudo o que ministrou num só bimestre a um determinado número de questões: dez, nove, 15, não importa. Ele geralmente passa toda a matéria no quadro-negro ou em forma de ditado. Quando há livro, pede que os alunos leiam o que está ali e façam resumo ou respondam às questões. Corrige, se necessário, questão por questão. Geralmente as questões não são relacionais, não são críticas. No campo das ciências exatas, o aluno deve decorar as fórmulas para a solução dos problemas. E no fim do bimestre o professor apresenta algumas questões que os alunos devem decorar para a prova. Em sua "generosidade" avisa que dessas dez questões vai usar apenas cinco na prova. Ou alunos decoram ou, se forem mais astutos, colam; acabada a prova, joga-se fora a cola ou joga-se fora da memória aquilo que foi decorado. No outro bimestre, como o ponto é outro, haverá outras dez questões para ser decoradas e assim sucessivamente: a aprendizagem não significou nada a não ser algumas técnicas de memorização e de burla. É inadmissível que com tantos recursos à disposição um professor se sirva de técnicas antiquadas e sem sentido. Exigir que um aluno decore coisas cujo sentido ele nem percebe, que nem mesmo tornarão a ser mencionadas no decorrer dos estudos, constitui um absurdo que será antes de mais nada constatado pelo próprio aluno.
PROFESSOR TIOZINHO
"Tiozinho", no sentido depreciativo, é aquele professor que gasta aulas e mais aulas dando conselhos aos alunos. Trata-os como se fossem seus sobrinhos, quer saber tudo sobre a vida deles, o que fazem depois da escola, aonde vão, os lugares que freqüentam e emite opiniões em assuntos de cunho privado que absolutamente não competem a ele. O professor tiozinho de sente um pouco psicólogo também, e maus psicólogo, é claro. Começa desde logo a diagnosticar os problemas dos alunos e se acha qualificado para isso.
Geralmente conselho não funciona com aluno. O espaço que o professor dá é aquele que permite ao aluno sentir-se à vontade para conversar, nunca para que se sinta obrigado a expor sua vida privada em sala porque o professor quer ser um "tio" bom. E isso não muda comportamento; a amizade e a confiança não podem ser forçadas, nascem de um movimento natural de convivência saudável.
PROFESSOR EDUCADOR
O professor que se busca construir é aquele que consiga de verdade ser um educador, que conheça o universo do educando, que tenha bom senso, que permita e proporcione o desenvolvimento da autonomia de seus alunos. Que tenha entusiasmo, paixão; que vibre com as conquistas de cada um de seus alunos, não descrimine ninguém, não se mostre mais próximo de alguns, deixando os outros à deriva. Que seja politicamente participativo, que suas opiniões possam ter sentido para os alunos, sabendo sempre que ele é um líder que tem nas mãos a responsabilidade de conduzir um processo de crescimento humano, de formação de cidadãos, de fomento de novos líderes. Ninguém se torna um professor perfeito, aliás aquele que se acha perfeito, e portanto nada mais tem a aprender, acaba de transformando num grande risco para a comunidade educativa. No conhecimento não existe o ponto estático - ou se está em crescimento, ou em queda. Aquele que se considera perfeito está em queda livre porque é incapaz de rever seus métodos, de ouvir outras idéias, de tentar ser melhor.
(catarina_samba@yahoo.com.br)

Educação do projecto! 

FROM: AMADEU NGULA
(Resenha da obra pelo autor)
Depois de quase quarenta anos de descolonização e, sobretudo, com o início do terceiro milénio, não obstante os esforços feitos em diversos âmbitos da vida, especialmente no campo do desenvolvimento económico e naquele daeducação, a análise dos problemas africanos leva necessariamente a um certo pessimismo, pois não só este continente se encontra à deriva e na cauda do desenvolvimento mas, e sobretudo, porque inserido numa marginalização progressiva de um mundo cada vez mais globalizado, a maior parte dos seus Estados está a precipitar-se num colapso cada vez mais acentuado. Não se trata nem de afro-pessimismo, nem de afro-optimismo como advoga a maior parte da literatura africana contemporânea, mas sim de afro-realismo. Para o autor desta obra, a crise sócio-económica e política da África actual é também uma crise de identidade cultural. A África encontra-se numa encruzilhada. Capturados pela tradição e rodeados pela modernidade, os africanos vivem ao mesmo tempo, as duas ilusões. Na realidade dos factos é a ilusão da modernidade que devora dia após dia, diante dos nossos olhos, aquela tradicional. Numa tal situação, os idealistas e actores das organizações sociais não partem de um vazio, mas de uma confusão cultural, chegando a elaborar apenas doutrinas, políticas e organizações em crise e, portanto, ilusórias. Visto que o permanecer e o aprofundar-se de uma tal confusão, poderia levar as jovens gerações africanas num nichilismo cultural e moral, o que seria catastrófico para a vida do continente num futuro próximo, esta obra postula a Pedagogia do Projecto para tutelar a vida dos africanos hoje à mercê de uma modernidade jamais assumida e de uma tradição em crise. Conscientes da multiplicidade dos factores que concorreram para tal situação, como pedagogos, tentamos apenas dar uma resposta essencialmente didáctica. Que papel pode jogar a educação (escola) em relação a tudo aquilo que acontece na África de hoje? Dividido em cinco capítulos, este livro quer ser uma reflexão de ordem geral sobre a acção pedagógica em África e, por isso, apresenta-se como uma síntese actualizada da filosofia da UNESCO no continente e é, ao mesmo tempo, uma tentativa única da materialização de um Modelo escolar desta Organização. Atreves das 8 Conferências dos Ministros africanos de Educação (MINEDAF) sob a égide da UNESCO, [Adis-Abeba ou MINEDAF I (1961), Abidjan ou MINEDAF II (1964), Nairobi ou MINEDAF III (1968), Lagos ou MINEDAF IV (1976), Harare ou MINEDAF V (1982), Dakar ou MINEDAF VI (1991), Durban ou MINEDAF VII (1998) e Dar-es-Salam ou MMINEDAF VIII (2002)], o livro tenta esboçar a evolução da escolarização e o percurso dos sistemas educativos africanos logo a seguir às independências, terminando com uma proposta didáctico-educativa para a renovação do sistema escolar angolano, após uma confrontação entre o modeloUNESCO e a praxe educativa angolana.Nesse sentido, o volume constitui uma tentativa orgânica de reconstrução e de análise das Conferências e dos debates dos Ministros de Educação e dos Estados membros da África nestes últimos 40 anos, em matéria de educação, e mais exactamente, da escolarização. A estrutura teórica desta obra é de carácter pedagógico-didáctica. De facto, a resposta que vem dada para a solução dos problemas actuais da África e de Angola em particular é essencialmente didáctica: o método proposto (Cooperative Learning) é fundamento de uma educação libertadora e é um verdadeiro exercício de democracia. Isto quer significar que a experiência cooperativa da ajuda recíproca na escola cria ressupostos para assumir comportamentos e atitudes democráticas, numa palavra, uma cultura democrática? a partir da escola. É aqui que se introduz o conceito de PEDAGOGIA DO PROJECTO que quer estabelecer as passagens de uma educação domesticadora para uma educação libertadora, de uma pedagogia impositiva para uma pedagogia de resistência, de um sistema escolar piramidal para um sistema de rede difusa. Eis, então, que o PROJECTO se torna o lugar da actuação destas passagens, onde o homem (aluno) deixa de ser um simples espectador, tornando-se num sujeito, de certo modo, actor e autor do seu próprio destino. No conceito de Pedagogia do Projecto está ínsita a ideia de intencionalidade, da relação, da possibilidade, da racionalidade, da construção e do futuro. A assunção desta perspectiva é tríplice: antes de tudo, pela convicção de que a flexibilidade será, doravante, o horizonte dentro do qual se orienta o agir educativo, sobretudo quando se trata de elaborar práticas, teorias e políticas educativas; depois, a convicção de que não obstante as grandes ilusões, a África começou o seu êxodo rumo a centralidade da educação na solução dos seus problemas. Embora, na prática, pareça uma resposta insignificante e frágil diante da imensidade dos problemas que afligem o continente, este volume advoga que a educação é ainda a única e a via melhor para despertar a consciência e a dignidade do homem africano; enfim, tenta (re)propôr a educação, não só como meio precioso e indispensável para o alcance dos ideais da paz, da liberdade e da justiça social, mas também para o alcance do desenvolvimento pessoal e social da África. Por conseguinte, documentando as diversidades das situações africanas no campo educativo, este volume torna-se uma reflexão pedagógica para o renascimento e o desenvolvimento do continente através a primazia da educação. Por isso, termina recordando ao mundo indiferente o drama da África, sustentando que a África não é um continente à deriva nem uma carroça que se desligou da frenética máquina do progresso sem limites, mas é sim uma parte da humanidade que luta, não só pela sua sobrevivência, mas pelo (re)encontro da sua específica identidade e subjectividade na história dos outros povos. A África não pode permanecer vítima do etnocentrismo ocidental, nem da sua própria estagnação cultural, mas deverá afrontar o desafio de conjugar o tradicional com o moderno num amplo projecto de planificação estratégico e nisso a educação terá muito por fazer.

Paz social em Angola 

(José Adriano UKWATCHALI)
Convidado a refletir brevemente sobre o actual momento da nossa nação, urge começar por uma advertência: este estudo é somente um contributo, e unicamente isto, para aquilo que na minha visão ajuda a crescer Angola. Estive, num debate com dois intelectuais italianos, um filósofo e um presidente de uma associação de encontro entre os povos, e estes prognosticavam um futuro ainda muito sombrio para a parte austral da África preconizando possíveis conflitos ainda em territórios desta parte do continente.Creio começar desta constatação, que me levou a defender com grande fervor, a tese de ter chegada a hora da África, aquela de dizer a sua voz, mas construindo com coragem o seu destino. Angola é considerada neste contexto austral-africano uma "potencia", e para tal interesse estranhos a realidade do país começam, já a divisar no horizonte político um possível descalabro. São vozes que nos bastidores dos "privatizadores do mundo", as chamadas "potencias globalizadoras", fazem orgulhosamente sentirem as suas mais macabras intenções. Há países como os Estados Unidos e a França que estão atentissimos aos movimentos da formação política que em Angola. Aquele que por mais de 30 anos foi considerada rebelde agora mostrou ao mundo, ao continente e ao país exemplo de existência democrática, elegendo para si um novo presidente, o sr Isais Samakuva, antigo representante deste grupo em França e na Inglaterra. Estes mesmos países e outros estão a estudar mecanismos em como cooperar com o país, entretanto se devem averiguar bem as modalidades de jogo, para que se evitem autogolos na nova senda política nacional. Eles se autoproclamam como os “global leaders” e um deles correm para uma "global governasse" e neste âmbito quer decidir as regras no campo. Olhando para as presenças à edição FILDA (Feira Internacional de Luanda)2004, se vêem patentes estes interesses e por isso, se deve estar cauteloso ao rubricar certos protocolos de cooperação, neste momento de paz e, sobretudo com as lobby's americanas e francesas que muitas vezes não nos fazem chegar ao ponto-chaves e aos lugares estratégicos destes paises para uma ajuda que traga um desenvolvimento sustentável de Angola. A nova situação angolana não pode ser monopólio de alguns como se escuta em alguns círculos nacionais e internacionais e também como se pode adivinhar a partir do movimentar-se das pedras do xadrez socio-politico angolano, todas as peças devem ser utilizadas, do rei passando pela rainha, torre, cavalo e peões, todos têm uma importância, só assim com uma constante consulta popular, e não, restringindo tudo ao Conselho da Republica, que se saberá o pensar popular.O Conselho da Republica é omni-compreensivo sim, mas não é a única voz do povo. É mister neste caso, começar por trabalhar, através de "referendum populares" para se obter aquilo que é a voz do povo sobre os problemas que o dizem respeito. Vive-se em Angola uma paz real, mas é ainda aquela do calar das armas, falta a da dignificação do angolano na sua identidade de pessoa humana com desejos, necessidades, direitos e deveres. É a chamada "paz social" que falta celebrar, embora se esteja a concluir a celebração a "paz militar", mas ainda mesmo a militar deixa espaços de intervenção profundos, como o da desminagem total do país e da remoçao total do territòrio dos engenhos inesplosos, a recolha de armas nas mãos de muitos civis que armados durante o período deflagrante da guerra, hoje constituem um perigo publico à nação. Para uma séria "paz social", o país deverá investir muito na cultura da cidadania, onde o angolano seja formado civicamente nos princípios constitucionais que fundam uma cidadania democrática, com os pressupostos antropológicos da cultura popular angolana. Eis, porque, uma Nova Constituição do País ancorada na Ética Angolana, em que os valores da tradição cultural angolana sejam presentes, é urgente. A Escola na Nova Angola em paz será uma instrução ao "sentido do individuo" reconhecido como pessoa, sujeito de responsabilidades, autonomia, caracter, prática de autogoverno, luta pela iniciativa. É uma Educação defendida pelo Pe.Dr.Amadeu Ngula, na sua tese de Doctorato, uma Pedagogia de projecto, com programas escolares mais abertos, professores seguido e reciclado, com justa e pontual remuneração. A saúde numa Angola em busca da "paz social" não pode passar inteiramente aos "maximizadores de lucro" (economia especulativa), que se concretiza nas clinicas privadas espalhadas na cidade de Luanda, onde tudo é explicado a partir de uma "moeda globalizante", as assim chamadas "verde-americanas",quase a levar em Angola o "American way life". Uma saùde que valorize a medicina tradicional,capaz esta de dialogar com a modernidade, através de jovens gerações empenhadas numa pesquisa cientifica continua para melhorar a vida e dar qualidade à mesma. Saùde que passe pela limpeza das cidades e educação básica à mesma, respeito de lugares públicos e assegurar de tal maneira a populaçao que o governo no orçamento geral do Estado meta à disposição uma quantia verdadeiramente credível e não ilusória. As culpas dadas outrora à guerra se esfumaram e perderam razoes de existirem, os diamantes continuam a serem explorados, o petróleo a ser extraído e vendido, para isto, se pode louvar a grande iniciativa que se teve em abrir um dialogo com a parceria nacional, para entrar neste sector, muito "externalizado". Pa ra que a "paz social" seja uma realidade, se deve pugnar por uma cultura partidária angolana, que garanta espaços de solidariedade, de tolerância,de respeito recíproco entre as diversas pertenças e identidades partidárias, que se inter-cruzam na vida das famílias e das comunidades e, assim, produzir a nível cultural uma consciência nacional. Daí o valor de um programa à nível de toda Angola: um projecto de consciência nacional que respeite as autonomias regionais e valorize as identidades étnicas, riquezas de um mosaico territorial. Neste caso, uma nova "cultura dos partidos" lugares de exercício da cidadania democrática, onde se colocam as bases de uma comum pertença, para lá das diferenças ideológicas, programas políticos. Os partidos com assento parlamentar maioritário nesta hora particular da nossa história de Angola tem uma obrigação: escolhidos pelo povo é momento de rever a temporalidade da presença deles nos órgãos decisivos da nação e começar a questionar-se sobre a legitimidade jurídica das instituições que representam. Por isso, devem honrar os nobres valores angolanos da honestidade, honradez, sinceridade e lealdade.Os angolanos que se mergulharam vergonhosa e egoisticamente na corrupção, para uma "paz social" no país, são convidados a entrar modestamente nas suas consciências (esperando que ainda as tenham) e a construir uma Angola onde o patrimônio público seja respeitado como Bem-Comum e evitar desmandos sociais, que se escutam até em partidos onde a confiança do povo colocou mais o seu voto no já longínquos 1992. É hora que o Tribunal de Contas do País comece a assumir as suas tarefas e chame os cidadãos em causa à legalidade.Por José Adriano UKWATCALI e-mail:http://ukwa@libero.it

Africa nossa, Nossa Africa! 

FELICIANO PALANGA (Madrid)
A história dos povos africanos está marcada por acontecimentos fortes na sua longa existência. Ainda hoje continuam vivas, de maneira latente, as conseqüências antropológicas, sociais, religiosas, econômicas e políticas do comercio de escravos (exportação de milhões de africanos), literal e oficialmente abolido na primeira metade do século XIX.Continuam quentes os resultados nefastos da luta pela conquista da independência e soberania africanas, efemérides notáveis dos anos 50-60 para a maior parte das ex –colônias já que a grande maioria saiu da caverna a partir da década de 60 (para os anglófonos e francófonos) e 70 (para os lusófonos). Outros países só alcançaram o ar livre nos últimos anos do século passado. Sangrentas säo as guerras civis e fratricidas, resultantes – obviamente – de má fé demonstrada pelas antigas potências colonizadoras no momento de deixar “amargamente” os territórios que tinham conquistado, ou ainda recebido da fração continental operada em Berlin. Os nossos tempos, por conseguinte, não só se aprecem ao fracasso como também expressam a fatalidade e a desgraça de gente sem número que vive à soleira, esperando que os dias se encurtem, porque viver assim não vale a pena. Estes conflitos – breves ou quase ‘eternos’-, podem ser considerados outro mal ‘endêmico’ que persegue o continente mais esquecido do planeta terra: África. Angola, Ruwanda, Congo Democrático, Somália, Eritreia, Liberia, Uganda, sobressaem entre vários casos. Entre as democracias limitadas e até mesmo inconsistentes que regem os estados africanos, encontramos algumas excepções entre tantos males.Entretanto a consciência colectiva está enferma; os planos sociais carecem de filosofias de fundo com derterminação convincente; a independência se confunde, às vezes, com a auto-ruina de uma nação, de homens e das estruturas físicas de manutenção. Nasce, portanto, a dependência que não passa de outra forma de escravatura ou neocolonialismo, por assim dizer. Merece também especial atenção a propagação do HIV, inimigo sem espingarda empunhada, mas terrivelmente demolidor. O crônico paludismo e seus afluentes continuam a ceifar vidas ininterruptamente. Quem se decide a tomar uma iniciativa eficaz para extirpar essas pragas? Ninguém. Os senhores do mundo preferem umas férias galácticas no espaço, gastando mundos e fundos a pagar um duro para subsanar a morte certa de milhöes de pessoas. Este silêncio, acompanhado de simuladas lágrimas provenientes das convenções filantrópicas, é também uma forma de conceder terreno ao subdesenvolvimento. Este mundo ferido profundamente no seu ser, empobrecido cultural, tradicional e antropológicamente, se encontra, agora na encruzilhada entre a luta pela sobrevivência e a urgência de optar pelas novas tecnologias globalizando-se.Ora, quem não tem voz nem vez ocupará – na concorrência entre as nações – o lugar de expectador sem estímulos. Neste caso, pois, valem estas comunidades enquanto tiverem aspectos econômicos ou sociais que excitem a curiosidade, a fome de possuir dos que mais alto falam. Tal situação leva-nos a ‘desconfiar’ das reais intençöes de alguns, por mais santas que pareçam. Sim, a melopéia pode significar um canto musical bem harmonizado ou também uma embriaguez. Depois de uma larga e dura história marcada por miragens, Angola chegou, finalmente, ao momento de respirar e contemplar outros horizontes: tomara que fossem horizontes novos. Superadas (ao menos aparentemente) as barreiras entre os filhos da mesma pátria, nasceu para todos o sol da reconstrução da consciência, das infra-estruturas, do tempo, da imagem deturpada da cidadania, em fim, a recomposição do homem angolano, reconduzindo-o ao lugar que bem merece.É um espaço providencial que nos toca a enfrentar com responsabilidade e memória histórica. É verdade que “por detrás de uma revolta há quase sempre um pai Caim”. Por isso, as vozes isoladas que reclamam pela sensibilidade colectiva de todos os órgäos da nação, ressentem as convulsões de um aparelho com os filtros do ar, todavia por substituir ou também por limpar bem interiormente. Nunca se falou tanto da necessidade da educação como nos nossos dias; dificilmente se escutavam vozes bem intencionadas a exigir o mínimo da assistência sanitária como hoje, rompendo com o medo tradicional imposto pelas leis representativas nominais que vigoravam no asfalto e pelos imperiosos princípios democráticos extremos reinantes no bosque. Mas, actualmente, se ataca incisivamente tais situações, esperando os gritos da maioria comovam os corações dos que podem decidir para o bem de todos, porque viver dignamente é um direito fundamental da pessoa humana. Sem desvalorizar algum aspecto social prioritário, considero importante o problema da escolaridade. Se o incremento da escola para todos e, até mesmo de forma obrigatória, para os níveis básicos, se estabelecer como norma, brevemente o país despertará do sono em que se encontra há séculos. Estudar, aprender é a via mais segura que torna um povo livre e democraticamente maduro; é a previsäo que interessa e interessará às gerações futuras. Näo se deve assistir de braços cruzados ao fenómeno mais perigoso que as minas sem localização: milhares de crianças e jovens sem oportunidade de preparação acadêmica, ao menos como base para vencer o crônico analfabetismo. Ademais, as alternativas de conseguir o mínimo de escolaridade desde os paises estrangeiros (em voga para muitos jovens) não devem transformar-se em regra que dita as sentenças; aliás, se a excepção se constituir em via normal, tarde ou cedo a cegueira intelectual consumirá as poucas reservas que tentam suportar as lacunas da maioria.E. Neste sentido, a eterna dependência vigorará ao longo de mais séculos. Creio ser importante tomar a peito o factor ensino. Nenhum povo consegue sair do subdesenvolvimento sem optar pela formação-instruçãoo séria e adequada dos seus filhos. Não devemos bater palmas diante do que nos vale hoje; temos que trabalhar fortemente com os olhos postos no futuro. É preciso animar esses entusiasmados rapazes que repartem o tempo entre obras e universidade (basta entrar em Portugal, França, Holanda, España…para contemplar amargamente a este fenómeno); é urgente aliviar o sacrifício de centenas de raparigas que trabalham mais do uma central eléctrica: limpeza de casa em casa, cuidar os velhos (ironia do destino: os mesmo velhos que na sua tenra idade foram cuidados pelos nossos avós, e hoje já no ocaso dos seus dias estão elas a ‘reencarnar’a tarefa humilhante dos seus antepassados), para conseguir amortizar a propina universitária, o aluguer e a manutenção da casa, água, telefone, a própria comida. E quando as forças começam a minguar, algumas transformam os seus belos corpos em autênticas minas de diamante. Que lástima! Tampouco se espera grande coisa, salvo raras excepções. Um individuo fatigado de tanto esforço não chega a render bem academicamente. Consentir, impávido e sereno, esta “escalofriante” tragédia seria cavar nossa própria fossa, porque ignorar também é uma forma de trair. Esta realidade, dramaticamente exposta, não é uma ficçäo científica, é um retrato fidedigno dos factos ocorrestes aqui e acolá, e verdadeiramente preocupantes. Esta é a hora de aprender com o tempo e com a história; chegou a ocasião de fazer um corte histórico, pois mudar faz parte da verdade. Quando se separa a liberdade da verdade os indivíduos entram em confusão, os assuntos vitais são relegados à segunda esfera. Irmäo e amigo, espero näo haver desiludido as suas expectativas. A minha inquietaçäo pode ser também sua, por isso nossa: é tempo de mudar de mentalidad e corregir a história com bons criterios.
Feliciano Palanga (Witcher) E-mail: wima22@hotmail.com ou witcher@katamail.com
 

Educação , desenvolvimento e democracia 

FABIANA CLEDI STRADA RIBAS (Licenciatura em Ciências Biológicas – UCS / Caxias do Sul, Mestrado em Educação Ambiental – FURG/ Rio Grandedo Sul Brasil)

A educação e os níveis de ensino são elementos de identificação de uma determinada comunidade e indicam também o seu desenvolvimento. Desenvolvimento pode ser entendido como ações e processos continuados de adaptação e aperfeiçoamento das condições do ser humano para consigo e para com o ambiente. A educação interfere diretamente sobre esses processos e sobre essas ações. Os movimentos pedagógicos institucionalizados ou não formam e estruturam as convivências sociais. Conforme as informações, instruções e ensinamentos que um grupo recebe, pode ou não desenvolver projetos, executar ações, viabilizar pesquisas, inovações e criação de novas tecnologias e atividades. O avançar em direção a novas estratégias pressupõe antecedentes do aprender e formações intelectuais. O aprender a viver está implícito nas trocas desde o nascimento, mas o ensino regular intervem e pode caracterizar o indivíduo, direcionando para uma ou para outra área. A educação formalizada, institucionalizada, ou seja, o ensino escolar é gerador de conhecimento e aprendizagem, acrescentando, suprimindo, retocando e modificando aptidões ou habilidades humanas; preparando os seres para a ampliação do desenvolvimento social, cultural ou econômico. Os níveis de alfabetização e a experiência acumulada de um povo facilitam a efetivação de medidas educacionais. O retorno e produtividade da educação podem e devem ser concebidos, destinados, direcionados ao processo de vida coletiva das comunidades. Do ponto de vista social, isto é, levar o ensino, o conhecimento e os saberes a todos os cidadãos em forma de projetos renovados de oportunidades e opções. A instrução (o saber) deveria estar revestido de dimensão dinâmica, substituindo antigos padrões, sugerindo consistência e responsabilidade, mas relações de aprendizagem e ensino. O retorno e produtividade da educação podem ser gerados e direcionados para a vida coletiva. Isso quer dizer, para o contexto social, levar o ensino a toda a população, onde projetos renovados de oportunidades atenderiam interesses individuais e também do país como um todo. A instrução deve se revestir de uma dinâmica sem constrangimentos. No processo educacional, as formas de relação de poder se sucedem, sem que se possa aceita-la ou renega-la. No ambiente social, livre de regulamentos e normas do ensino regular, a captação de informações e o desenvolvimento de habilidades se fazem diretamente no aprendizado com a natureza e com as experiências pessoais diretas. A espontaneidade da educação não formal não descaracteriza a relação ensino-aprendizagem, nem distorce o fenômeno de aprender. A convivência transfere hábitos, crenças e valores, do mesmo modo que pode incitar a investigação, a rebeldia e o inconformismo. De qualquer forma as mensagens que são transmitidas para todos os membros da sociedade, sendo passivas ou ativas, exercem funções para o desenvolvimento e exercício de democracia na mesma.

Democracia na União Africana 

JÚLIO KUVALELA (pro-jurista em Roma)
A União Africana é hoje uma realidade, cujas principais instituições vão fortalecendo a sua funcionalidade há já um ano e meio. O presidente sul-africano, Tabu Mbeki, tendo sido o anfitrião da primeira Assembleia Ordinária da União, assumiu por primeiro o cargo anual da Presidência da mesma. No seu discurso, no acto proclamativo, Mbeki saudou os 39 anos da experiência da O.U.A. na luta contra o colonialismo e o Apartheid e sublinhou que “a experiência dos últimos 39 anos diz-nos que os nossos povos gritam por democracia, por um bom governo que erradique a corrupção, implante os direitos do homem, a paz e a estabilidade”. Mesmo o polémico líder líbio, Muammar al Kaddafi, afirmou: “os africanos querem ser ajudados sem condições e não são mendigos. Não somos aprendizes que devam ser instruídos. Aprendemos já na difícil escola da vida. Tentaremos defender os direitos do homem e construir uma democracia popular, segundo próprios métodos e estilo. A criação da União Africana concretiza o meu grande sonho”. O grande desafio é, de facto, pôr em prática os princípios enunciados no Acto Constitutivo, de modo a atingir os objectivos a que se propõe a União. Os povos de África têm necessidade gritante de governos queridos e originados pelo povo, e que se empenhem no respeito dos direitos humanos, promovam a emancipação económica, lutem por erradicar a pobreza, combatam o flagelo do continente, o SIDA, e tirem proveito dos imensos recursos do continente. De tais portentosas responsabilidades é consciente o senhor Alpha Oumar Konaré, do Mali, que na segunda sessão da Assembleia Ordinária, tida em Maputo-Moçambique, Julho do ano transacto, foi eleito como primeiro presidente da Comissão da União, quando no seu discurso de nomeação ao tão prestimoso cargo, afirmava: “O progresso social e económico dos nossos povos, num ambiente de paz e segurança, constitui o objectivo primário da agenda da Organização. Permitam-me dizê-lo, alto e em bom tom, que os sonhos da África permaneceram longamente no limbo… É facto assente que, em algumas partes do Continente, o tumulto político conspirou, juntamente com as grandes endemias como o HIV/SIDA, lacerando a estabilidade dos países afectos, deixando os nossos povos em uma miséria incomparável. É verdade também que muita vez o crescimento económico não se traduziu em progresso social, tal é o sofrimento dos nossos povos. O cenário é prevalentemente cinzento, para não exagerar. Não obstante, tais factos não nos devem levar a esquecer os grandes passos feitos pelos países africanos, desde a sua ascensão à independência. A situação actual não pode desencorajar a nossa determinação em melhorar a nossa casa e construirmos o Continente dos nossos sonhos – uma África unida, fortificada com o pluralismo e a diversidade, uma África que represente um ninho de esperança para as gerações presentes e futuras”. No artigo 3° do Acto Constitutivo, alíneas g) e h) elenca entre os objectivos “a promoção das instituições e princípios democráticos, a participação popular e bom governo” e bem assim, “promover e proteger os direitos humanos e dos povos, em conformidade com a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos e outros instrumentos relevantes em matéria de direitos humanos”.
Na sequência das independências, muitas vezes os países africanos caíram em mãos de ditadores, que os governaram com punho de ferro e sem respeito nem implementação do estado de direito. Em alguns países, como por exemplo foi o caso de Angola, a utopia comunista, sob o estandarte da filosofia marxista-leninista, foi imposta ao modelo de Estado, implantando-se um sistema político mono-partidário, esclusivista e repressivo. Hoje, porém, quer-se enveredar pela estrada do exercício democrático, onde um sistema de eleições periódicas e a ascensão ao poder através dos modos previstos na Constituição debelem para sempre o espectro da arbitrariedade e da tirania que graçou por vários anos em grande parte da África, tendo-se degenerando tantas vezes em sangrentos conflitos civis. Basta de golpes de Estado e inconstitucionalidade! A conferência sobre Eleições, Democracia e boa ‘governance’, tida em Pretória, Africa do Sul, de 7-10 de Abril de 2003 teve como objectivo rebater a questão da legalidade e preservação da ordem constitucional, tendo produzido um Communiqué, cujas directivas e princípios operativos foram endereçados aos Estados membros da União Africana. A União é atenta a seguir a evolução dos factos políticos em vários Estados africanos, onde muitas vezes se tornou uma panaceia a mudança intempestiva e inconstitucional de governos, através de constantes golpes de Estado, prática condenada pela Declaração de Lomé sobre as Mudanças Inconstitucionais de Governos, cujos princípios e parâmetros foram recentemente rechamados pelo Mecanismo de Prevenção, Gestão e Resolução dos Conflitos, na sua 90ª sessão ordinária de 17 de Março de 2003 [EX/CL/Dec. 42 (III)]. Com efeito, no seu artigo 4°, alínea p), o Acto Constitutivo sublinha: “a condenação e rejeição das mudanças inconstitucionais de governos”. Estes sinais positivos mostram como este novo Ente Político está a operar, a fim de que os princípios democráticos enunciados no Acto Constitutivo possam tomar raízes e plasmar-se na nova, forte e unida Mãe África. O sucesso desta experiência de integração, com uma politica e prospectivas económicas comuns em todo o Continente, depende especialmente a “determinação de promover os direitos humanos e dos povos, de consolidar uma cultura e as instituições democráticas, investi-las de poderes e recursos necessários para capacitá-las a desempenhar efectivamente a sua função”, tal qual vem exarado no preambulo do Acto Constitutivo. A existência de uma África unida e forte permitirá que ela possa ter voz e vez, independente dos esquemas do neo-colonialismo; só unida a África poderá sobreviver e relançar-se no desenvolvimento económico, que passa necessariamente pela consolidação das instituições democráticas, liberando-se, desse modo, das teias da corrupção, opressão e instabilidade socio-económica. Uma África unida e coesa leva à estabilidade e assegura que os vastos recursos da África sejam primariamente utilizados em benefício dos povos africanos e não o contrário, como o foi desde o período das independências até ao presente período neo-colonial. A África unida poderá fazer valer o seu peso, inspirando-se nos valores da verdadeira democracia e insuflando-os eficazmente nas instituições de credito mundiais, como é o caso da Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial, bem como forjar uma maior participação nos negócios, regras e transacções correntes na Organização Mundial do Comércio, cujas decisões muitas vezes são tomadas por potencias industriais e simplesmente a seu favor, sem considerar as posições e contribuições decorrentes das situações e condições especificas dos países em via de desenvolvimento. Tal foi, por exemplo, o impasse nas recentes negociações tidas na Cimeira de Cancún, México (Setembro 2003), onde infelizmente a pertinácia da União Europeia e dos Estados Unidos da América nas políticas de recusa em abrir as portas dos seus mercados aos produtos agrícolas dos países em vias de desenvolvimento, bem como a rejeição em proceder a cortes aos altíssimos subsídios do Estado concedidos os seus agricultores, o que leva os seus produtos a preços de competição desleal do “dumping”, monopolizando até mesmo os mercados dos países pobres, não permitiram chegar-se ao desejado acordo, por uma justa e igual participação no aparato da economia global. Segundo os analistas da Banca Mundial, se se conseguisse chagar ao acordo, se poderia fazer aumentar o PIB mundial até € 445 biliões no ano 2015, tirando dos níveis de pobreza cerca de 144 milhões de pessoas. Um outro sinal positivo de empenho sério na implementação dos princípios democráticos e observância dos direitos humanos é a adopção, a 11 de Julho na Assembleia dos Chefes de Estados e de Governos de Maputo, do Protocolo à Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos sobre os Direitos das Mulheres em África, considerado como um passo significativo nos esforços de promoção e no assegurar-se o respeito dos direitos das mulheres africanas. Com efeito, à Carta Africana, adoptada na Conferência da O.U.A. de Banjul (Gambia), no dia 27 de Junho de 1981 e entrada em vigor aos 21 de Outubro de 1986, faltava este complemento que vem, na certa, a esclarecer a situação das mulheres que já há muito sentiam a necessidade do sustentáculo de um instrumento legal para defender os próprios direitos e liberdades fundamentais, numa sociedade culturalmente assaz machista. O Protocolo exige dos governos africanos a eliminação de todas as formas de descriminação e violência contra as mulheres em África, e que se proponham a promover a igualdade entre as mulheres e os homens. O Protocolo exorta outrossim os governos do Continente, se ainda não o tiverem feito, a incluir nas próprias constituições e outros instrumentos legislativos estes princípios fundamentais e assegurar a sua efectiva observância. E ainda, obriga-os a integrar uma atenção com respeito ao género nas decisões políticas, legislação, planos de desenvolvimento, actividades e assegurar uma boa condição de vida das mulheres. Depois da ratificação do 15° Estado, o Protocolo entrará em vigor e na Assembleia de Maputo os Estados foram vivamente recomendados a aviar e acelerar o processo de ratificação, em conformidade com as regras procedimentais nacionais.

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